Chega de educação progressista, por Eduardo Nunes*
Fala-se e escreve-se, o tempo todo e em toda parte, que o Brasil está em vias de se tornar uma das potências dominantes do cenário global – mas tais previsões costumam vir acompanhadas de uma condicional: se quisermos chegar lá, teremos de investir em educação. É aqui que o leitor se pergunta: mas já não estamos investindo em educação? Para onde vão os 25% do orçamento que todo gestor público tem a obrigação legal de destinar a essa área? Depois de passar sete anos acompanhando, como professor, o cotidiano da escola pública, posso afirmar que o principal problema do nosso ensino não é falta de verbas, mas falta de rumo. E ouso levantar uma questão que tem sido pouco discutida: a educação brasileira só é tão ruim por ser “boa demais”, pelo menos no papel. Se tomarmos os textos das leis que norteiam o ensino no país ou os regimentos das secretarias municipais e estaduais de Educação, se lermos as ementas das disciplinas dos cursos de Pedagogia ou se ouvirmos o que é debatido em seminários de educadores, choraremos de emoção e teremos a sensação de que nossas escolas são o melhor dos mundos. Tais textos, geralmente redigidos em prosa poética, estão repletos de belas expressões como “inclusão”, “gestão democrática”, “construção do conhecimento”, “leitura da realidade”, “libertação dos oprimidos”, “formação do ser humano integral”. Os arautos da corrente que hoje domina a intelligentsia educacional brasileira, e que chamam a si mesmos de “progressistas”, defendem esses princípios com fervor quase religioso e travam uma luta de vida e morte contra o paradigma anterior, que rotulam como “educação tradicional”. A educação tradicional, aquela em que a maioria dos brasileiros com mais de 25 anos foi alfabetizada, foi demonizada. “Tradicional” tornou-se um xingamento. Ao assumir o comando dos órgãos que cuidam da educação no país, lá pelo fim da década de 80, os novos timoneiros identificaram o paradigma então vigente com o autoritarismo da ditadura e trataram de exorcizar as escolas das práticas tidas como “tradicionais” e “autoritárias”: a transmissão de conhecimento de um professor que sabe para um aluno que não sabe, a reprovação dos alunos que não aprendem, a memorização pela repetição, o bê-á-bá, a exaltação dos que tiram boas notas. Desde então, evita-se ao máximo reprovar, pois isso “traumatiza” o aluno. A repetição da tabuada e os ditados para fixar a grafia das palavras também são evitados, pois “deformam a consciência”. Os currículos escolares foram permeados de atividades lúdicas e recreativas, destinadas a estimular a aceitação e a “inclusão”. O resultado, duas décadas depois, é que milhões de analfabetos funcionais saem das escolas públicas, todos os anos, com certificados de conclusão embaixo do braço. No seu afã de conscientizar e libertar os oprimidos, a educação progressista os condenou à escravidão da falta de qualificação. Vivendo num mundo de faz de conta onde a interação social é mais importante que o conteúdo, os “libertadores” não percebem que a verdadeira libertação é ter condições de ser selecionado para um bom emprego, de ser aprovado no vestibular, de passar em um concurso público, e isso é negado à maioria dos alunos das escolas públicas. O avanço de que necessitamos para abraçar o nosso destino de potência global se assemelha mais, por paradoxal que seja, a um retrocesso, uma volta ao tempo em que o conhecimento era medido e aplicado, os professores eram respeitados e valorizados e os alunos só eram aprovados se aprendessem.
* Filósofo e jornalista
Extraído de Zero Hora de 03/04/2011.
Marcelo,
ResponderExcluirTexto muito bom. Que ironia...Todos os "chefões" da educação deveriam
lê-lo... Talvez isso produzisse algum resultado.
Um abraço
Benilde
Quem sabe um dia teremos educação progressista!
ResponderExcluirA verdade é que ainda somos os mesmos e vivemos como nosso pais. O maior absurdo é que a educação nunca mudou e ficam condenando os princípios construcionistas. O modelo Tradicional de educação foi realmente demonizado mas nunca deixou nossas salas de aula. Acredito que um dia nos libertaremos dela também na prática e não só no papel dos políticos. Esse modelo epistemológico já provou que é o maior responsável pelo fracasso escolar e só piorou quando foi maquiado de construtivista. Não é possível vivermos cinco séculos com o mesmo pensamento de que o conhecimento possa ser transmitido como algo palpável. Voltar ao passado nunca foi solução prá nada. O dia que esclarecermos esses conceitos chegaremos a solução dos nossos problemas e neste dia teremos sim uma educação construtivista e progressista.
Pedro Elias
Sinto um certo alívio e conforto quando leio "coisas" desse tipo... afinal de contas a educação que eu (nós) recebi foi "não progressista" e tradicional. E se sou e tenho o que tenho hoje é consequência dessa educação (e umas palmadas e castigos também). Todo mundo quer ser especialista em educação, dar palpites e tudo o mais... mas será que o especialista não seria o professor que está diretamente com os alunos todos os dias...
ResponderExcluirQuem me dera meus alunos saberem a tabuada...
(nome preservado)